Diálogo para a esperança

O mundo pode ter dado, na quarta-feira (26), o seu passo mais determinante, até o momento, na busca por solução para um dos principais problemas da humanidade nos últimos meses. O conflito entre Rússia e Ucrânia, que completou um ano no fim de fevereiro, encontra-se num impasse que ameaça, pela primeira vez em décadas, o normalmente estável continente europeu. As tratativas de paz vêm falhando desde, pelo menos, maio do ano passado, em grande parte devido ao desinteresse real de que as nações cessem fogo e caminhem para o entendimento. Entretanto, quarta-feira, um novo ator entrou em cena: o presidente da República Popular da China, Xi Jinping, contactou por telefone o líder ucraniano, Volodymyr Zelensky.

Xi Jinping é um dos chefes de Estados mais relevantes do mundo, que lidera a maior população do planeta e a segunda maior economia do mundo. Ele já manteve encontros com o colega russo, Vladimir Putin, mostrou que não está em defesa de nenhuma das partes do conflito, como tem sido com as potências ocidentais. Em diálogo permanente com a Rússia, agora abre as portas de sua diplomacia para a Ucrânia, a fim de buscar entendimentos mútuos.

“Ninguém vence uma guerra nuclear” foi uma das afirmações marcantes de Xi Jinping, na conversa com Zelensky. Ao dizê-lo, lembrou ao outro líder que travar uma guerra contra uma potência nuclear é uma luta sem vencedores, visto que o acosso final à Rússia levará ao uso de suas bombas atômicas, gerando preocupação da comunidade internacional. Xi Jinping também reforçou suas intenções em conhecer com profundidade a realidade ucraniana, assim como prometer o envio de um diplomata especializado à região, a fim de conversar profundamente com todas as partes envolvidas sobre a solução política da crise ucraniana. .

Zelensky, por sua vez, lembrou a importância dos 31 anos de entendimentos diplomáticos entre Ucrânia e China, o que se confunde com a história do país, independente desde 1991, com o fim da União Soviética. Ele reiterou seu apoio ao princípio de “uma só China”, isto é, da recuperação de soberania chinesa sobre todos os seus territórios.

Tais pontos centrais de um bem-sucedido diálogo, demonstram a capacidade da diplomacia chinesa em evitar conflitos. O que Xi Jinping apresenta a Zelensky é a possibilidade de evitar as ganas por dividendos a curto prazo, dado o potencial devastador desta guerra. É preciso entender que o acordo entre os dois países só será possível assim que, sentados à mesa de negociações, Rússia e Ucrânia aceitarem ceder em alguns de seus objetivos, e reconhecer legitimidade nas reivindicações um do outro, tornando possível um entendimento em que prevaleça um resultado razoável para ambos os lados, ainda que nenhum seja, necessariamente, declarado vencedor.

Até porque, declarar-se vencedor representaria, de fato, alguma melhora para a vida das duas populações envolvidas na guerra?

Para a Ucrânia, o resultado mais óbvio de uma guerra longa seria a total aniquilação física de suas cidades e territórios, com um número ainda maior de refugiados e mortos. Não há como a Ucrânia vencer a guerra, visto seu inventário militar já estar praticamente zerado, e seus soldados já reunirem muitos mercenários, tudo bancado pelo apoio das potências ocidentais. Estas, porém, uma hora sofrerão pressão interna para retrocederem, visto que o armamento da Ucrânia gera custos inflacionários nos países de origem.

Para a Rússia, por outro lado, a ameaça à integridade territorial e à sua população é mínima. Ninguém vai realizar ataques físicos a uma potência nuclear. Entretanto, o país de Vladimir Putin pode sofrer o que seus antecessores soviéticos sofreram com o conflito, parecido, no Afeganistão. Uma guerra prolongada, sem efeitos práticos, levada a cabo por uma década, levou o país à bancarrota e sua população à fome.

Ou seja, o que Xi Jinping propõe é que se largue mão de objetivos belicistas que nunca farão bem a qualquer nação. Conforme a tradição chinesa, é melhor esperar, avaliar cada situação e lograr pequenas conquistas baseadas em diálogos constantes, que no curso do tempo representarão a vitória do país em suas bandeiras históricas. Tendo sempre no horizonte que, quando se trata da relação entre os povos, o caminho do mútuo entendimento é sempre a saída possível para que todas as partes ganhem, e possam formar uma sociedade mais próspera e harmônica. Portanto, a tradição chinesa chega a esse problema internacional, apontando caminhos para um mundo em que, para que todos ganhem, todos cooperem.

Agora, a China deu um passo mais ousado, apresentando-se na questão como ator direto na busca da paz. Que ambos os países alcancem resultados frutíferos!

 

Por Hélio de Mendonça Rocha, articulista e repórter de política internacional

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