Buenos Aires – O presidente argentino Javier Milei, que assumiu o cargo em 10 de dezembro de 2023, marcou seus primeiros 100 dias no cargo com medidas de austeridade e disputas políticas com governadores provinciais.
MEDIDAS DE “CHOQUE”
A terceira maior economia da América Latina, depois do Brasil e do México, enfrenta desafios econômicos significativos, entre eles a alta inflação.
O sociólogo argentino Marcelo Rodríguez, diretor do Centro de Estudos e Formação Marxista Hector P. Agosti, disse que o país está testemunhando “um dos maiores programas de austeridade já implementados na história da Argentina, com cortes de gastos em áreas muito sensíveis e demissões que estão aumentando a cada dia”.
De acordo com Milei, as medidas são necessárias para colocar a Argentina no caminho da recuperação econômica, do crescimento e do desenvolvimento após o governo de seu antecessor, Alberto Fernández.
No entanto, Rodríguez observou que a taxa de desemprego deve chegar a 8% em breve, ante 6,8% no final do mandato de Fernández.
As obras públicas, um importante motor da economia argentina, foram interrompidas pela atual administração e mais de 50.000 empregos foram perdidos, disse o analista.
“Se acrescentarmos isso a um congelamento da atividade industrial, demissões no setor público e um declínio muito grande na vida econômica do país, então estamos realmente enfrentando uma situação muito difícil”, disse Rodríguez.
“Ele apresentou uma iniciativa conhecida como ‘Lei Ônibus’ com mais de 1.000 reformas de diferentes tipos e um Decreto de Necessidade e Urgência (DNU) que também propõe muitas reformas que são regressivas para a vida econômica e política do país”, disse ele.
Ambos os documentos geraram protestos de sindicatos e organizações sociais, juntamente com greves em alguns setores, e foram derrubados pelo Congresso Nacional da Argentina em votações separadas.
“Estamos vendo a aplicação de medidas de ‘choque’ e um vasto programa de austeridade como parte de um ultra-neoliberalismo severo em questões econômicas”, disse o analista.
“Seu principal problema é a inflação e, nesse aspecto, ele ainda não mostrou resultados. A questão é quanto tempo as pessoas vão esperar pelos resultados, dada a situação social crítica”, disse o analista político Rosendo Fraga, membro da Academia Nacional de Ciências Morais e Políticas da Argentina.
“Não só o poder de compra dos salários formais e informais diminuiu, como também as pensões estão em seu nível mais baixo da história”, disse ele.
DISPUTAS POLÍTICAS ACIRRADAS
Milei, 53 anos, assumiu o cargo após vencer o segundo turno em 19 de novembro com 55,65% dos votos.
“Hoje começa uma nova era na Argentina. Encerramos uma longa e triste história de decadência e declínio e iniciamos o caminho para a reconstrução de nosso país”, disse Milei em seu discurso de posse, pedindo o fim de “décadas de fracasso, brigas internas e lutas sem sentido”.
Os oponentes políticos de Milei manifestaram preocupação com as medidas rigorosas de aperto de cinto e com a maneira enérgica com que estão sendo impostas.
O porta-voz da presidência, Manuel Adorni, disse em 15 de março, após o último revés da DNU no Senado argentino, que o governo prefere “o consenso, mas também estamos dispostos a confrontar” para revelar “quem está com o povo e quem está cuidando de seus próprios interesses”.
Recentemente, o discurso político argentino incluiu termos como “casta política” e slogans como “eles não enxergam”, usados pelo partido governista para criticar aqueles que não apoiam suas propostas.
De acordo com Adorni, “déficit zero, inflação mais baixa e a consolidação do banco central são metas inegociáveis” das reformas.
“Nós vamos conseguir isso com ou sem a colaboração daqueles que estão tentando mais uma vez obstruir o caminho da mudança. Pedimos a todos os argentinos que tenham paciência e confiança”, disse ele.
Em relação à política externa, Rodríguez se referiu a um “alinhamento claro e forte” com as políticas dos Estados Unidos e de Israel.
Uma das primeiras medidas que Milei tomou foi cancelar a entrada da Argentina no bloco BRICS, que ocorreu em 1º de janeiro de 2024, disse Rodríguez.
“Tudo parece indicar que Milei continuará propondo medidas de austeridade e cedendo a soberania e os recursos da Argentina, o que gerará muitos conflitos”, acrescentou Rodríguez.
De acordo com Fraga, os primeiros 100 dias de Milei evidenciaram seu estilo de liderança conflituoso, que ficou evidente durante sua campanha eleitoral.
Olhando para o futuro próximo, Fraga e Rodríguez compartilham a opinião de que o resto do ano “continuará tenso e conflituoso”.
“A luta com os governadores das províncias por recursos continuará permanentemente. O relacionamento com as duas câmaras do Congresso continuará a ser difícil”, acrescentou.