A sexta conferência ministerial do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (PLP) vai decorrer entre 21 e 23 de abril e inclui a assinatura do plano de ação do organismo, mais conhecido como Fórum de Macau, até 2027, e o Encontro de Empresários da China e dos Países de Língua Portuguesa.
A Câmara de Comércio Portugal-China, das pequenas e médias empresas, anunciou que, durante o evento, assinará três protocolos de cooperação: o primeiro, com a China Construction Sixth Engineering Bureau e a Zhuhai Hengqin África Central de Consultoria Empresarial; o segundo, com o Centro de Promoção, Cooperação e Desenvolvimento das Pequenas e Médias Empresas da China e a Zhuhai Hengqin África Oriental, de Consultoria Empresarial; por fim, com a Dayou Thechnology Industry (Henan) e a Zhuhai Hengqin Sinolusa de Consultoria Empresarial.
O evento vai “identificar as principais áreas de cooperação económica e comercial entre a China e os PLP nos próximos três anos e dinamizar o papel de Macau enquanto plataforma de serviços” entre a China e os países de língua portuguesa.
As exportações de mercadorias dos PLP para a China atingiram 147,5 mil milhões de dólares (136,1 mil milhões de euros) no ano passado, um novo recorde histórico.
As exportações aumentaram 6,2% em comparação com 2022, sobretudo devido ao maior fornecedor lusófono do mercado chinês, o Brasil, cujas vendas subiram 11,9%, para 122,4 mil milhões de dólares (112,9 mil milhões de euros), um novo máximo histórico.
Apesar de uma ligeira queda, as exportações de Angola atingiram 18,9 mil milhões de dólares (17,4 mil milhões de euros), e as vendas de mercadorias de Portugal para a China, 2,91 mil milhões de dólares (2,69 mil milhões de euros). As exportações moçambicanas aumentaram 33,9% para 1,79 mil milhões de dólares (1,65 mil milhões de euros), também um novo recorde máximo, enquanto as vendas cabo-verdianas mais que triplicaram, embora apenas para um valor de 72 mil dólares (66 mil euros). O crescimento das exportações dos PLP para a China depende sobretudo da iniciativa dos empresários desses países e do apoio dos seus governos para incentivar a chegada ao mercado chinês.
Sem a China, a economia mundial estaria em recessão e a economia alemã, a locomotiva da UE, e que entrou em 2024 já num processo recessivo, teria sofrido perdas catastróficas e arrastado consigo a economia europeia. Tal não era inevitável. A economia europeia e a Alemanha em particular sofreram danos severos com a pandemia, a guerra na Ucrânia e o boicote do Acordo Global UE-China sobre o Investimento. A retomada deste acordo podia ter evitado a queda da Europa, e a adesão ao documento “A posição da China sobre a solução política da crise na Ucrânia” conduziria ao cessar das hostilidades e à retomada das negociações de paz.
A China desempenha hoje um papel fundamental na negociação de conflitos e na contenção da guerra. Neste contexto, a Conferência Ministerial do Fórum de Macau para a diplomacia dos Países de Língua Portuguesa assume uma particular importância. Nos últimos anos a China, o Brasil, Angola e os restantes países de língua oficial portuguesa têm vindo a construir um polo comum do multilateralismo, com uma crescente influência na política mundial, onde Portugal pode e deve colocar-se estrategicamente.
Entre os PLP, o Brasil foi o maior parceiro comercial chinês, com importações a atingirem 59,1 mil milhões de dólares (54,5 mil milhões de euros), seguido de Portugal, que comprou da China mercadorias no valor de 5,79 mil milhões de dólares (5,34 mil milhões de euros).
Ao todo, as trocas comerciais entre os países de língua portuguesa e a China atingiram 220,9 mil milhões de dólares em 2023 (203,7 mil milhões de euros), mais 2,8% do que no ano anterior.
A República Popular da China registou um défice comercial de 74,1 mil milhões de dólares (68,3 mil milhões de euros) com o grupo lusófono no ano passado, também um novo recorde histórico, que desmente a ideia falaciosa de que as relações comerciais com a China conduzem à dependência e à dominação económica.
A proximidade histórica de Macau
Mas a atividade do Fórum de Macau não se limita ao comércio entre a China e os países lusófonos, que era pouco mais de 11 biliões de dólares na data de fundação, em 2003, e atingiu 220,9 mil milhões de dólares, no ano passado.
Os investidores chineses estabeleceram nos países de língua portuguesa centenas de empresas de investimento direto, tal foi o caso da Huawei, Chery, XCMG e a Gree, construindo unidades de produção nestes países. Outras como a China Three Gorges, Fosun, PetroChina e o Banco de Construção da China adquiriram e investiram em empresas dos PLP, mesmo quando a crise financeira nos EUA bloqueou os mercados financeiros. O Fundo de Cooperação e Desenvolvimento China – Países de Língua Portuguesa foi criado.
O investimento da China nos PLP distingue-se da estratégia das multinacionais do denominado Ocidente, por cinco qualidades: parcerias estratégicas, capitalização e aumento do património, com reinvestimento dos resultados; ausência de despedimentos, manutenção das equipas de administração e gestão nacionais e orientação para as necessidades do mercado dos países cooperantes.
O leque dos domínios de cooperação entre a China e os PLP tornou-se cada vez mais alargado. Destaque para o Centro de Formação do Fórum de Macau, criado com o objetivo de preparar funcionários públicos provenientes dos países de língua portuguesa e a disseminação dos Institutos Confúcio, que tem vindo a impulsionar o intercâmbio entre as diferentes culturas e idiomas. Na China, dezenas de faculdades oferecem hoje cursos de língua portuguesa. A Reunião Ministerial Extraordinária do Fórum de Macau (2022) permitiu traçar um plano comum de combate à pandemia, de retomada do crescimento económico e reforçar o papel de Macau como plataforma entre a China e os PLP.
O projeto da Grande Baía
A China elevou a um nível superior o projeto do Fórum de Macau, nascido há mais de vinte anos, com o desígnio de fazer de Macau uma plataforma de ligação entre a China e os países de língua portuguesa e contribuir para a diversificação da economia da Região Administrativa Especial de Macau, quando em 2019, anunciou o plano de desenvolvimento da Área da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. Das onze cidades envolvidas, quatro foram destacadas para liderar, as core cities deste plano de desenvolvimento: Guangzhou, Shenzhen, capital tecnológica não só da China mas também do mundo, Hong Kong e Macau. Um sistema gigante de grandes pontes viárias e ferroviárias, integradas com modernos aeroportos, a IA a comandar os grandes portos, a descarbonização dos transportes, já hoje são realidades.
Em Portugal, na atual conjuntura política, ganharam relevância duas notícias, que a Câmara de Comércio e Indústria Luso-Chinesa (CCILC) colocou em evidência:
A entrevista de José Cesário, o secretário de Estado das Comunidades do novo Governo recém-eleito de Portugal liderado por Luís Montenegro, ao afirmar que a proximidade com Macau é prioridade, sublinhando a necessidade de dar atenção à qualidade dos serviços consulares e ao funcionamento da Escola Portuguesa. Falando de Macau, José Cesário afirmou ainda ser um local especial onde se sente a portugalidade e o amor a Portugal, sublinhando então que o estabelecimento de uma relação de proximidade será uma prioridade governativa.
A CCILC destaca também a entrevista à agência Lusa do presidente do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC), Arlindo Oliveira, professor catedrático da mais prestigiada universidade técnica do país – o Instituto Superior Técnico, que afirma: haverá uma redução da concorrência e da qualidade de serviços prestados se as companhias chinesas continuarem sobre ataque dos Estados Unidos e da União Europeia, e avisa que “uma tentativa de isolamento da China só vai contribuir para piorar as relações entre o Ocidente e a China”.
O professor e investigador valoriza a ligação histórica de Portugal a Macau, e sublinha que o país “devia ter uma responsabilidade especial na manutenção de canais abertos com Macau e, através de Macau, com a parte continental da China, e não devia estar entre os países mais agressivos nesta componente de limitar a tecnologia chinesa”.
E assume a crítica frontal à mentalidade da guerra fria. “Até porque tentar excluir a China do mercado central é estar a partir o mundo em dois e partir em dois é mau do ponto de vista político e da defesa dos direitos humanos, é mau de um ponto de vista económico e, acima de tudo, é mau de um ponto de vista estratégico”, argumenta, recordando que o mundo já viveu partido em dois. “Viver no mundo partido em dois, numa altura em que a tecnologia é o que é, em que as armas nucleares são o que são, em que a manipulação social através de tecnologia é o que é (…), é muito perigoso e acho que a evolução positiva que houve quando acabou a Guerra Fria estamos agora em riscos de inverter”…
E conclui, “tanto a China como os Estados Unidos estão muito à frente nestas tecnologias (IA…) e a Europa está a correr um bocadinho atrás e só não usamos mais tecnologia chinesa por razões geopolíticas.”
Finalmente, queremos destacar a recente visita do presidente angolano, João Lourenço, à China, e a entrevista que concedeu ao Grupo de Mídia da China onde se dirigiu à comunidade internacional e, falando em português, aos PLP, o presidente de Angola evidenciou a cooperação da China, durante os últimos vinte anos, que permitiu reconstruir as infraestruturas destruídas pela guerra e o seu apoio à diversificação e modernização da atividade económica, tal como a abertura do mercado chinês às exportações de Angola, representando hoje 18% das trocas comerciais dos PLP, logo após as 75% do Brasil, enfatizando finalmente a política internacional da China como defensora da paz e do desenvolvimento sustentável de toda a humanidade.
Por Antônio dos Santos Queirós, professor e investigador, Universidade de Lisboa